24 agosto, 2011

Pensar


Eu não costumo pensar nas coisas. Só quando elas deixam de fazer sentido.
E é um acto tão natural como ver o sol nascer de manhã e não pensar mais nisso. O sol nasce de manhã e essa é a ordem natural das coisas.
Pensar nas coisas é por em causa todo o significado que elas têm para nós.

Sempre que senti necessidade de pensar nas coisas, essa vontade foi aniquilada pelo desejo voraz de prazer momentâneo.
Pensar é incómodo, penoso.
Sou dominada pelo impulso, pela emoção do instante à miragem do prazer, da satisfação. Rasgo-me por dentro, odeio-me, desprezo-me, quando me traio ao disfarçar-me de racional, como se agisse com segundas intenções.
A reflexão e a análise são coisas que me agridem.
O juízo é algo a que não me permito.
Ser imparcial é uma pretensão que não tenho.

Cada um encerra em si próprio a responsabilidade de ser feliz e a possibilidade de participar na felicidade do outro. Como um exercício da sua vontade e não como um fardo que tem de carregar. A traição do outro provoca uma dor estupidamente superficial ao comparar com a da nossa própria traição. Uma negação de ser feliz.

Sou sedenta de prazer e nada é mais doloroso do que deixa-lo escorrer por entre os dedos. Instintivamente, o desejo incontrolável sobrepõe-se a qualquer teoria, chutando a razão para um canto sem qualquer arrependimento. Pensar é deixar de sentir.

(ando a vasculhar caderninhos antigos numa espécie de obrigação resignada... este texto é de 1995)

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