20 janeiro, 2012

Automaticamente

Hoje sonhei contigo. Estranhamente sonhei contigo.
Estranho, por me lembrar do meu sonho (e que bom que foi contigo). E ainda mais estranho por ser contigo! É que mesmo que te veja quase todos os dias, já faz muito tempo que não trocamos mais do que um "bom dia", sussurrado entre os dentes. Poucas são já as vezes que esboço um sorriso, com medo de encarar o teu. O olhar também já raramente se tranca um no outro, como antigamente. Por vezes sou eu que o desvio, refugiando-o no chão cinzento, outras és tu que o vagueias numa parede vazia qualquer.

Acordei espantada. As sensações eram confusas, contraditórias.
Um consolo desconfortável. Éramos novamente cúmplices de olhares, gestos e palavras.
Não conheço os lugares por onde andámos, apenas que caminhámos abraçados a rir de uma parvoíce qualquer. Daquelas que eu sempre inventei para quebrar entre nós a tensão dos impossíveis. Tu sorrias e acenavas, como sempre fazias. Entravas no jogo e atiravas com outro disparate ainda mais absurdo. Sempre conseguiste arrancar-me uma gargalhada que me anestesiava de tudo o que eu não queria saber! Era essa liberdade que eu amava, de quem não leva a vida muito a sério. A casa pouco mobilada, o frigorifico vazio, a cama propositadamente por fazer. Os dias sem horas marcadas, as viagens à deriva sem planear nada.
Era essa liberdade selvagem que eu bebia de ti, deliciada, todos os segundos que entre gestos, olhares e palavras te consegui ter.
Ao teu jeito, passaste os dedos nos meus lábios, puxando-me o queixo para cima, para que os meus olhos fixassem os teus. Foi então que disseste as palavras mágicas, aquelas que apenas poderias proferir num sonho, as que evaporavam timidamente ao amanhecer: "Gosto tanto de ti". Soletraste devagar, para que eu acreditasse no que nunca conseguiste dizer.
Não me lembro de mais nada. Acordei baralhada. Queria voltar para aquele lugar encantado, conversar novamente contigo, abanar-te, sacudir-te, bater-te se fosse preciso.

Depois vi-te, agora à luz do dia, na distância do presente.
Estavas a 1 metro de mim e apetecia-me explodir, gritar-te que estive contigo esta noite. Mas não consegui.
Tu sorriste sereno. Eu também sorri. Automaticamente dissemos "Bom dia", apenas.

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