05 dezembro, 2011

Não dá




«Não dá» disse-lhe por entre frases desconexas, desencontradas e sem sentido.
O quê? Ela não sabe, nem perguntou. Ele também não. Nem porquê ou como. Mas disse-o.
Soltou-se entre frases perdidas. Ambos sabem que os caminhos por onde andam não se irão cruzar mais. Que o mundo gira para o lado contrário sem parar e um vento forte os afasta.
E tudo se resume num «como estás?», e uma resposta evasiva simultânea «não muito bem». Um silêncio profundo, dorido, incapaz de ir além.
Seguem-se frases a jorrar palavras sem sentido. É preciso gritar estas palavras ocas até que os ouvidos doam e rasguem a pele. Fingir o impossível, na impotência de tudo o que se quer e não se tem.
«Temos de falar» disse-lhe num turbilhão de emoções tanto tempo contidas, prestes a explodir.
Falar de quê? Para quê? Pergunta-se na imensidão de vazio que lhe deixou, no silêncio abrupto onde a encarcerou sem explicação.
Porquê agora? Hoje? Neste momento?
Agride-a, certeiro com uma pedra na cabeça. E, ainda em transe, tudo à volta treme, o chão foge, por momentos perde a direcção.
«Um tempo», ela tinha pedido, lembra-se, um tempo de vida que ele não esperou.
«Não dá» zumbe-lhe aos ouvidos como se fosse a resposta ao seu pedido, aquela que tardou. Abrasiva, chega-lhe agora aos ouvidos desprevenidos, arranha-lhe a alma moribunda e suga-lhe uma réstia de vida do corpo que resvala, pelo abismo, sem precaução.


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